segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Take your time ou o disco novo do Chico ou uma tarde chuvosa em Estocolmo.

O dia aqui em Estocolmo, como de costume cinzento e frio, foi acompanhado por uma insistente e gelada garoa. Pensei em passar o dia em casa, debaixo dos cobertores, na companhia de Issie, uma gata Birma, tão linda quanto preguiçosa.

Lá pelas duas da tarde resolvi tomar um banho quente e sair para caminhar um pouco, talvez comer alguma coisa aqui perto. Vesti as mil camadas de roupa, coloquei o Ipod pra tocar e segui em frente. Acidentalmente, fui parar no novo CD do Chico e, como os piguinhos gelados da chuva que caía em meu rosto, as canções foram me tocando uma a uma, e fui sentindo o meu país entrando por cada poro.

Tinha ouvido pela primeira vez pouco antes de sair do Brasil. Ouvi o início de todas as músicas, me detive em umas duas ou três, e esqueci. Nada me tocou realmente naquele momento e, pensei: um disco praticamente feito para aquela boboca do cabelo cor de abóbora não podia ter mesmo nada de mais.

Mas algo aconteceu nesta tarde fria e, ainda que reconheça que a obra não prima pela originalidade - já que pude reconhecer em muitas das canções referências a outras canções do próprio Chico - o disco é apaixonado, gostoso de ouvir, e tem um gingado brasileiro que fez logo meu andar, antes rígido de frio, tornar-se, de certa maneira, lânguido, sinuoso, por assim dizer.

"Sem você 2" - uma das sensações de deja vu que não dizem respeito apenas ao nome da canção - traduz aquela solidão de quem não é sozinho. Sabe quando seu amor saiu de casa pra almoçar na casa da mãe e você pensa: "Uau! Vou ter tempo de fazer minhas coisas, organizar a gaveta, fazer a depilação?" Mas, passadas duas horas... Quanta saudade... E, em mim, que saudade desse sentimento.

"Sou eu" é uma delícia, e sou eu... Com o perdão do trocadilho, sou aquela moça... Passado o momento confidência, a música me remete a "Deixa a Menina" do próprio Chico. Mas amei o rítmo, o vocal de Diogo Nogueira, o clima de gafieira. Vi o vídeo dos bastidores das gravações no Youtube e o astral entre os dois é galhardo, feliz, o que rendeu um registro tão bom. E quem vai ser o sortudo? Quem leva a moça pra casa? Galhardia, adoro essa palavra. Quase esqueci Estocolmo, e a chuva fina e fria em meu nariz...

"Nina" me lembra um pouco Cecília, do CD as Cidades ou mesmo, na melodia, "A noiva da cidade", que, aliás, é uma das minhas preferidas do Chico... Muitas vezes quis ser Cecília, a noiva da cidade, descuidada, como sou... Queria ele suspirando meu nome em silêncio, sem confundi-lo com qualquer música, pois "nem as sutis melodias merecem, Cecília, teu nome espalhar por aí". Nao falasse a letra sobre um relacionamento virtual e nao remetesse a Moscou, quase tão fria quanto minha doce Estocolmo, eu relevaria as coincidências...

"Barafunda", um sambinha bem Chico Buarque de Mangueira, com referências ao futebol, àquele bom e antigo futebol, de Garrincha e Pelé... Futebol com gingado verde e rosa, de Cartola, com cores e sabores do meu país, lembrando ainda o macho brasileiro safado que nao lembra o nome dela, "e salve este samba antes que o esquecimento baixe o seu manto cinzento".

"Sinhá" achei triste, e triste sem ser bonito... Porque, vocês hão de concordar, tem umas tristezas lindas. O próprio Chico tem umas tristezas lindas de doer, "(...) pelo amor de Deus, nao vê que isso é pecado, desprezar quem lhe quer bem, nao vê que Deus até fica zangado vendo alguém, abandonado, pelo amor de Deus.(...)" ou "(...) Oh, pedaço de mim, oh, metade apartada de mim, leva o que há de ti, que a saudade dói latejada, é assim como como uma fisgada no membro que já perdi (...)" Mas Sinhá não, é uma tristeza sem ser linda, e aí eu não gosto. Não gostei da melodia, da letra, nem da voz de Chico. Isso, eu que sempre gostei do Chico cantor, não gostei da voz em "Sinhá".

"Querido diário", faixa que abre o CD, tem linda melodia e instrumental. Me remete também a algo que conheco, do próprio Chico. Mas não identifiquei qual música. Me remete ao Chico escritor, descritivo,  canção visual. Posso ver as calçadas do Rio, o carro passando devagar, vendo as pessoas e suas histórias. O mais belo verso do CD está nesta canção "Hoje, afinal, conheci o amor. E era o amor uma obscura trama..." e o mais apropriado para o meu momento "mas eu não quebro não, porque sou macio". Excelente canção.

Gostei também de "Rubato", marchinha interessante, cadenciada, gostosa. Aqueceu meu caminhar.

"Essa pequena", nítidamente foi feita para o amor da terceira idade e a menina boboca do cabelo cor de abóbora. Sim, voce sentiu uma ponta de ciumes nessa declaração. Vou tentar ser imparcial, só que ao contrário. Falando sério, "o blues já valeu a pena". A musica é linda, a letra é charmosa, sensual. É, acho que ele nem sabe mesmo direito o que ela fala, mas isso não importa muito, ao que parece. O verso Take your time, deu tema a esse post, e deu tema a essa minha estadia na cinza Estocolmo. Estou tomando meu tempo.

"Não sei pra que/ outra história de amor esta hora/ porém você diz que está tipo afim/ de se jogar de cara num romance assim/ tipo pra vida inteira". São os versos iniciais de  "Tipo um baião", canção que comeca tímida, como uma baladinha, e explode em festa, em baião, em forró, em carnaval. E me fez chorar. As folhas amarelas caiam de uma grande árvore no caminho, um cenário lindo.  Mas o ritmo me levou lá pra Ladeira da Barra no Carnaval, me levou pro Museu do Ritmo, me levou pra minha Cruz das Almas no São João, me levou pro colo da minha mãe. Vou postar a letra da música em seguida, faz tempo que não posto a música do dia.

E já nao sei se era chuva o que escorria quente em meu rosto, e já nao sei se era frio o que passava em meu coração. Ah, se eu soubesse...

Enfim, tenho que agradecer à boboca do cabelo cor de abóbora por ter inspirado Chico a compor novamente. Lindo registro de amor. E aí, larará, lirirí...



terça-feira, 25 de outubro de 2011

Trocando em Miúdos

Hoje foi meu último dia no trabalho antes da viagem. Saí com a sensação incômoda de que nunca deveria ter entrado. No fim, perdi mais que ganhei, e só sobrou a saudade que vou sentir do convívio com alguns amigos queridos.
Essa é só uma das saudades que devem me acompanhar daqui por diante.
Por outro lado, uma vida nova e cheia de possibilidades me espera. "Ele" me espera, com o coração "spining like a cat".
Para hoje a noite, Chico Buarque para sentir, água termal para aliviar, relaxante muscular para descansar e uma taça de vinho para celebrar. Não necessariamente nessa mesma ordem.
Ou seria Chico Buarque para aliviar, relaxante muscular para sentir, água termal para celebrar e uma taça de vinho para descansar?
Whatever... Doesn´t matter.
Love you all...


domingo, 9 de outubro de 2011

O meu sumiço.

Aos que costumavam ler as postagems no Blog tenho que pedir desculpas. Minha vida mudou tanto nos últimos meses...
Mudei de casa, duas vezes. Só isso já era motivo suficiente para comprometer meu tempo e minha inspiração para escrever.
Voltei a trabalhar com advocacia, no mesmo escritório que trabalhava antes. Não fui feliz, novamente, permaneceram as mesmas insatisfações.
Conheci alguém muito especial e, por causa deste alguém, estou prestes a deixar a casa e o trabalho e mudar de país.
Ficaram tontos? Estou meio tonta até agora. Aliás, estes últimos meses foram de uma vertigem initerrupta.
Dia 01 de novembro embarcarei para a Suécia. Estou com medo e um frio na barriga que não passa. Mas ao mesmo tempo estou curiosa, ansiosa, excitada e, sobretudo, com saudade.
Não foi novidade para ninguém que me conhecia eu ter tomado essa decisão, eu sempre me guiei por esse meu coração selvagem.
Deixo vocês novamente, com uma música linda que resume os meus dias. Voltarei em breve para contar como está a vida lá no tempo frio e, espero, com o coração quente.

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Amando em inglês - Meu encontro com o Coldplay.

Sempre fui uma fã inveterada da música brasileira, me abri de coração apenas para raras exceções alienígenas. As exceções são notáveis, é verdade: Chet Backer, Nina Simone, Tom Waits, Janis Joplin, Beatles, Ella Fitzgerald, Billie Holiday. Ok, estão todos, infelizmente, mortos. Entre os vivos, menos ainda: Muse (que eu, e a Stephenie Meyer - é, aquela de Twilight -, amamos de paixão), U2 (o Bono ainda está vivo? Realmente vivo?), Placebo; Pearl Jam e certamente outros que, se eu não me lembro agora, é porque não gosto tanto assim.
Faz uns dias comentei com uma prima que estava querendo ouvir umas músicas em inglês, para aprender a falar sobre sentimentos naquela língua - não, vocês ainda não sabem o porquê, depois eu conto. Ela então me indicou que ouvisse Coldplay, pela boa pronúncia do vocalista, o marido da amarela da Gwyneth Paltrow.
Gravei então um CD no qual incluí ainda James Morrisson, James Blunt, Adele - que apesar do burburinho eu ainda não tinha ouvido, o novo da Sade e umas porcariazinhas impublicáveis que gosto de ouvir enquanto dirijo em dias de pressa. 
E foi aí que eu me perdi. Comecei pelo Coldplay. 
E veio logo Shiver, avassaladora pra mim, fiquei mesmo arrepiada e sabe com aquela "aguinha" rasa nos olhos? É realmente arrebatador ouvir coisas como "from he moment I wake, to the moment I sleep, I´ll be there by your side" e "Is this my final chance to getting you" e, principalmente "I´ll always be waiting for you". 
E o que dizer de Yellow? Deliciosa guitarrinha no início, vontade de cantar alto. Gwyneth, se alguém fizesse uma música assim pra mim um dia, mesmo me chamando de marrom, eu seria a mulher mais feliz do mundo. É, "you know, I love you so", que eu sempre pensei que fosse,"you know, I love your soul". Fica a dica: acho mais bonito assim. Mas "For you I´d bleed myself dry" não deixa dúvidas, é amor da única forma que vale a pena sentir, até a última gota de sangue, até não poder mais respirar. Como diria uma amiga querida,"sou dessas".
Trouble, é bem bonita também. Pedido de desculpas perfeito de alguém que sinceramente quer ser desculpado.
A verdade é que sim, as letras são super bobinhas, as melodias simples, principalmente se você não está apaixonado, ainda que pela vida, ou não é um adolescente cheio de vontade de salvar o mundo - ainda existem adolescentes com vontade de salvar o mundo? 
Mas para mim música boa é aquela que consegue me fazer sentir. Voltando para casa ontem à noite, ouvindo Coldplay eu senti, e esse momento é maravilhoso e digno de nota nessa vida que a gente leva, sempre correndo, sem tempo pra sentir. Chorei, e não era tristeza, nem saudade, nem medo. Era amor, emoção, beleza.
Ainda agora, enquanto escrevo, soa The Scientist, e me emociono quando ouço "I had to find you, tell you I need you" e "And tell me you love me, come back and haunt me, oh when I rush to the start".
É a simplicidade que me toca, a simplicidade da vida que se aproxima, das coisas tão simples que sempre sonhei. Meus sonhos bobos, de melodias simples, como as canções do Coldplay.
Ainda vou ter a sorte da Gwyneth, e talvez ele não me escreva Yellow e o mundo inteiro nem se dê conta de que existimos. Mas, ainda assim, o que deixaremos será tão precioso que o mundo vai até ficar um pouquinho melhor, ou mais simples, e mais bobinho, como as canções do Coldplay. E aí, já terá valido a pena.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Trinta e três invernos.



Acho que envelheci... Ou é a proximidade do inverno que sempre me deixa velha. Parece que o tempo não me passa em primaveras como aos demais, me passa em invernos.
Faço aniversário no verão, mas não chego a sentir o peso de mais um ano de vida nesta época, a sensação vem quando começa o inverno, com a chuva, e a vontade insistente de ter alguém em quem esquentar os pés por debaixo do cobertor. Vixe, como bem se diz aqui na Bahia... Que sair pra balada que nada, eu queria era cama quentinha e conversa ao pé do ouvido com alguém que fosse só rotina e conforto.
Lembro-me de quando não me rendia a essas vontades invernais. E não é que eu era bem feliz? Direto do túnel do tempo, vejo madrugadas de domingo, banho de mar no Porto da Barra até ver o sol nascer, depois de ter dançado e tomado champanhe com pedacinhos de ouro! Puro brilho essa época. Brilho também eram meus companheiros de noites quentes, amigos de hoje e de sempre, ainda que todo mundo, como eu, tenha mudado tanto.
Tinha também o videokê nas noites de quinta, quentes ou não. Sempre cantava a mesma música, a única em que eu conseguia boa pontuação, talvez pela voz mais grave, "Nos lençóis desse Reggae" da Zélia Duncan. Minha amiga sempre cantava alguma canção de Lulu Santos, se saía muito bem. E sempre saíamos com o sol nascendo e cantando "voe por todo mar e volte aqui, pro meu peito...". Madrugadas de pura alegria e jovem inconseqüência. Eu não sei se ela ainda canta Lulu Santos, ou se vai a videokê, mas minha lembrança dessa época é eterna, nossa amizade também. Ela certamente concordaria comigo, estamos ficando velhas a cada inverno. 
A prova disso, do envelhecimento, são essas lembranças... Gente velha adora lembrar do passado com aquele sorriso no rosto e aquela sensaçao de saudosismo. Saudosismo, sentimento de velho. Poderia ser o tema desse post.
Essas lembranças de gente velha sem ser me confortam um pouco o peito, evitam que ele congele diante da falta daquele pezinho... Aquele rotineiro e reconfortante pezinho por baixo do cobertor.


terça-feira, 12 de abril de 2011

Música de Hoje: O Quereres (Caetano Veloso)

Onde queres revólver sou coqueiro, onde queres dinheiro sou paixão
Onde queres descanso sou desejo, e onde sou só desejo queres não
E onde não queres nada, nada falta, e onde voas bem alta eu sou o chão
E onde pisas no chão minha alma salta, e ganha liberdade na amplidão

Onde queres família sou maluco, e onde queres romântico,burguês
Onde queres Leblon sou Pernambuco, e onde queres eunuco,garanhão
E onde queres o sim e o não, talvez, onde vês eu não vislumbro razão
Onde queres o lobo eu sou o irmão, e onde queres cowboy eu sou chinês

Ah, bruta flor do querer, ah, bruta flor, bruta flor
Onde queres o ato eu sou o espírito
e onde queres ternura eu sou tesão
Onde queres o livre decassílabo
e onde buscas o anjo eu sou mulher
Onde queres prazer sou o que dói
e onde queres tortura,mansidão
Onde queres o lar, revolução
e onde queres bandido eu sou o herói

Eu queria querer-te e amar o amor
construírmos dulcíssima prisão
E encontrar a mais justa adequação
tudo métrica e rima e nunca dor
Mas a vida é real e de viés
e vê só que cilada o amor me armou

E te quero e não queres como sou
não te quero e não queres como és

Onde queres comício, flipper vídeo
e onde queres romance, rock'nroll
Onde queres a lua eu sou o sol
onde a pura natura, o inceticídeo
E onde queres mistério eu sou a luz

Onde queres um canto, o mundo inteiro
Onde queres quaresma, fevereiro
e onde queres coqueiro eu sou obus
O quereres e o estares sempre a fim
do que em mim é de mim tão desigual
Faz-me querer-te bem, querer-te mal
bem a ti, mal ao quereres assim
Infinitivamente pessoal
e eu querendo querer-te sem ter fim
E querendo te aprender o total do querer
que há e do que não há em mim


Sinais

É preciso aprender a ler os sinais. Eles estão sempre lá.
Às vezes nos recusamos a vê-los por conforto ou por desejo.
E sempre ao olhar pra trás pensamos:
porque não percebi antes?
porque não dei atenção a eles enquanto piscavam em enormes letreiros de néon?
É preciso aprender a ler os sinais.
Eu preciso aprender a ler os sinais.

terça-feira, 5 de abril de 2011

Apesar de...

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“Uma das coisas que aprendi é que se deve viver apesar de. Apesar de, se deve comer. Apesar de, se deve amar. Apesar de, se deve morrer. Inclusive muitas vezes é o próprio apesar de que nos empurra para a frente.

Foi o apesar de que me deu uma angústia que insatisfeita fui a criadora de minha própria vida. Foi apesar de que parei na rua e fiquei olhando para você enquanto você esperava um táxi. E desde logo desejando você, esse teu corpo que nem sequer é bonito, mas é o corpo que eu quero. Mas quero inteira, com a alma também. Por isso, não faz mal que você não venha, esperarei quanto tempo for preciso.”


C. Lispector in Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres.

Minha vida e as seis vidas que não gerei - Uma história sobre o abortamento de repetição.

Me casei no dia 13 de novembro de 2004. Contava então 26 anos. Meu marido, que eu havia conhecido há um ano e um mês era a personificação do meu príncipe encantado: lindo, educado, doce e me fazia muito feliz. Estávamos muito apaixonados e o dia do nosso casamento foi realmente emocionante. A igreja estava linda, o meu vestido era delicado e romântico e além disso, só me lembro dos olhos dele, encantados, olhando para mim quando a porta se abriu. A orquestra tocava "Vieste", de Ivan Lins, como nos meus melhores sonhos. Sempre quis ser mãe e logo depois que casamos começamos a preparar a gravidez.
Em junho de 2005 engravidei pela primeira vez. Em realidade tive pouco tempo para sentir alegria, no mesmo dia em que peguei o exame Beta HCG, que confirmou a gravidez de poucos dias, comecei a ter um sangramento e no consultório médico me foi dito que estava sofrendo um princípio de aborto. Fui para casa dilacerada, era uma sexta-feira e não saí da cama todo o final de semana, na tentativa de evitar o inevitável, que foi confirmado na segunda-feira, com a repetição do teste de laboratório.
Muita gente dizia que isso era normal, que acontecia muitas vezes numa primeira gestação. O médico me disse que não havia com o que se preocupar, que logo que menstruasse outra vez poderia tentar uma nova gravidez.
Seguimos nossa vida e em agosto do mesmo ano a empresa do meu marido começou a dar muitos prejuízos e ele resolveu fechar. Ele tinha dupla nacionalidade e o sonho de morar fora do país. Eu tinha um bom emprego, mas não hesitei em deixar tudo e seguir o sonho dele. Era o meu homem, meu amor, por quem eu pegaria a casa e colocaria numa sacola, como na canção do Los Hermanos. Lembro de sentar na soleira da varanda de casa chorando enquanto via o caminhão de mudança levar os móveis que nós havíamos escolhido com tanto carinho. Mas lembro também da excitação pelo novo, nós dois em outro país, juntos, inseparáveis.
Em janeiro de 2006 viajamos pra Espanha e nos estabelecemos em Madrid. Alí engravidei pela segunda vez. Com a idéia romântica do que seria a saúde pública em um país de primeiro mundo, sofri meu segundo aborto em uma maca no corredor de um hospital público espanhol, sozinha. Meu marido não faltou ao trabalho naquele dia.
Alí me foi explicado que só se poderia começar a investigar o que estava causando as perdas a partir do terceiro aborto, já que até o segundo, ainda era considerado normal. Para mim a explicação parecia absurda, porque não havia nada de normal em uma mulher sofrer um aborto, normal para mim era engravidar e parir.
Engravidei novamente em março de 2007, mês do meu aniversário, desta vez protegida por um seguro de saúde particular. Sofri minha terceira perda, depois de idas e vindas incessantes a laboratórios e consultórios médicos. A terceira vez foi dolorosa fisicamente, em casa, em um domingo, diante da cara desolada e impotente de meu marido.
Em maio de 2007 decidimos retornar ao Brasil. Eu me sentia frustrada profissionalmente na Espanha e meu marido já não via com olhos tão sonhadores a sua aventura no país de sua segunda nacionalidade. Foi um período muito difícil para os dois. Embora tenhamos conhecido muitos lugares, culturas diferentes, a verdade é que a maior parte do tempo foi de uma rotina muito dura, à qual não estávamos acostumados.
A volta ao Brasil tampouco foi fácil. Não tínhamos conseguido juntar muito dinheiro e eu, particularmente, demorei a me recolocar no mercado de trabalho. Voltei a trabalhar apenas em agosto de 2007. Procuramos então um médico renomado e especialista em reprodução humana para que investigasse finalmente o nosso problema.
O primeiro médico, apenas baseado em um exame de glicemia, identificou que deveria fazer um tratamento indicado a diabéticos, com o uso diário da substância metformina e, segundo ele, com a baixa na glicemia eu poderia engravidar. Fiz o tratamento prescrito e sofri o meu quarto aborto.
Procuramos então outro especialista. Para mim foram pedidos inúmeros e complexos exames. Para ele, exames de rotina e um espermograma. Não havia nada de errado com nossos exames. O médico resolveu então nos pedir que fizéssemos um exame chamado crossmatch que identificaria nossa compatibilidade imunológica. Segundo o médico, a incompatibilidade imunológica era a causa de muitos dos abortamentos de repetição e, o melhor, havia tratamento para isso. Vale dizer que nem o exame nem o tratamento eram cobertos pelo plano de saúde e o custo de ambos era alto para os nossos padrões, mas tínhamos que tentar.
Fizemos o exame numa clínica especializada e o resultado foi positivo. Éramos, segundo o exame, incompatíveis imunologicamente. Se por um lado era ruim ter um problema, por outro lado nos deixou esperançosos detectá-lo e poder tratá-lo da forma adequada.
Nessa ocasião troquei o ginecologista, eu precisava de atenção depois de tantas perdas e o segundo médico não me pareceu muito disponível.
O terceiro médico, uma pessoa dulcíssima, bastante espiritualizada e muito competente, de posse dos exames que havíamos feito, nos encaminhou para o tratamento de imunoterapia com linfócitos, que consistia em aplicar em mim dolorosíssimas doses de uma vacina feita com o soro extraído do sangue do meu marido. Eram necessárias algumas aplicações semanais até que o exame finalmente desse negativo, o que aconteceu após a terceira semana.
Engravidei novamente, logo após o resultado do exame, e mais uma vez sofri a tristeza e a frustração de perder meu bebê.
Todos já estávamos muito estressados com isso. A família sofria, nós sofríamos. Com o tratamento para engravidar e a ansiedade decorrente de tantas perdas, engordei cerca de 20 kg. Nunca tive grandes problemas de autoestima e, fora o problema para engravidar, eu era feliz com meu marido. Ou pelo menos achava que era.
Em dezembro de 2008, especificamente na noite de Natal, enquanto seguíamos com o tratamento para engravidar- já que nos foi explicado que teríamos que seguir com as vacinas e tentar novamente - eu descobri a primeira traição de meu marido. Não consigo colocar em palavras a dor que senti nesse dia. Não era só a traição física, era a traiçao de um projeto inteiro de vida. Entretanto eu o perdoei. Entendia que tudo o que estávamos passando era muito duro, e que um momento de fraqueza poderia acometer qualquer um de nós dois. Para mim, o que tínhamos juntos era maior que tudo.
Em abril de 2009 engravidei pela sexta vez e novamente sofri uma perda. Já não havia muitas explicações por parte dos médicos e era tudo doloroso demais. Já havia começado a pensar em adotar um bebê, mas meu marido me dizia que não conseguiria amar como pai uma criança que não fosse biologicamente seu filho.
No mesmo abril descobri uma nova traição de meu marido. Era 21 de abril, estávamos em casa e eu ainda me recuperava do último trauma. Ele se justificou dizendo que não me amava mais como mulher e que não conseguia ver futuro em nosso relacionamento pelo fato de que eu não poderia lhe dar um filho.
As palavras dele me doeram mais que a traição em si.
Levei dois longos anos para me recuperar do que vivi, para conseguir superar a dor e limpar meu coração das mágoas que me impediam de amar de novo. Nesse período me cuidei muito, iniciei um tratamento com uma nutricionista para perder o peso que ganhei durante o casamento, me apaixonei pela academia e pelo bem estar que provoca uma boa corrida. Fiz novos amigos, vivi momentos inesquecíveis com eles. Me amei, acima de tudo.
Mas havia algo que ainda incomodava. A culpa, o peso de ser uma mulher que não podia gerar. O maior sonho da minha vida sempre foi ter um filho, uma família. Não realizar isso me deixaria para sempre incompleta.
Faz menos de um mês reencontrei meu ex-marido para que formalizássemos nosso divórcio. Não somos amigos, na verdade não ficou nada que justificasse uma amizade entre nós. Foi tudo muito doloroso para que algum sentimento sobrevivesse, nossa relação hoje é como um terreno estressado por tanto uso em que não nasce mais nada. Então não tínhamos muito que conversar.
Nessa ocasião, a da assinatura do divórcio, ele me confessou que sua atual mulher, que tem dois filhos do primeiro casamento, os quais, ao que parece, ele ama como filhos, tinha engravidado e também sofrido um aborto. Ele concluiu, então, que o problema sempre foi dele.
Para ele, pode não ter parecido relevante, mas aquela informação para mim teve um caráter extremamente libertário. Eu não tenho qualquer problema para ser mãe! Me sinto leve e livre finalmente para ter a família dos meus sonhos.
Me intriga que os médicos se comportem de forma um tanto quanto machista, ao centrar as investigações quanto ao abortamento de repetição sempre na mulher, quando é igualmente provável que o homem possa ter um problema. No meu caso, não posso dizer com absoluta certeza, porque nunca engravidei de outro homem, mas me parece que na ausência de identificação de um problema específico com a minha saúde, sofri um erro de diagnóstico que me custou muito sofrimento.
Nos anos em que passei por esse problema muitas vezes recorri à internet para me reconfortar ou me identificar nas histórias vividas por outras mulheres que sofriam do chamado abortamento de repetição ou recorrente. É boa a sensação de não estar sozinha quando você tem um problema que não entende.
Compartilho agora essa experiência para que as mulheres que hoje sofrem com isso incitem seus médicos a investigar profundamente também seus parceiros, esgotando as possibilidades antes de se submeterem a um tratamento doloroso e de resultados incertos.
Espero da próxima vez que falar sobre este assunto, seja para dizer que tudo corre bem com a minha nova gravidez e com a minha nova vida ao lado de um homem que me respeite, ame e mereça, como a mulher completa que eu sou.


sábado, 2 de abril de 2011

Nina Simone - My Baby Just Cares For Me- Special Extended Smoochtime Ver...

Outono - My baby just cares for me.

Como é possível ter saudade do que nunca se teve?
Como é possível que aquele que está reservado pra mim esteja tão em mim sem nunca haver estado?
E sem nunca haver estado, como é possível que eu sinta agora faltar um pedaço?
O meu outono chegou primavera como em seu hemisfério. Já não há folhas caídas, limpei-as todas. Tampouco há ventania.
Há grama verde, a tão ansiada grama verde. Há flores multicoloridas, calorzinho, brisa amena, crianças correndo no parque. Ouço seus gritinhos de alegria enquanto correm e brincam ao meu redor.
E ele está alí, ao meu alcance. Ainda não o toco, mas o vejo alí, sentado na grama verdinha, na minha grama verdinha.
Ele sorri e está tão feliz quanto eu de que tenha chegado enfim, depois de um longo inverno da alma, a nossa primavera.
Estamos emocionados e nos olhamos detalhadamente, sem pressa. Ainda não nos tocamos, mas é como se já fôssemos tão nossos que é saboroso guardar esse momento de olhar, de aprender nossos gestos, de deixar pra trás a estação passada e receber a nossa, só nossa, primavera.
A brisa cálida nos traz canções de amor que se misturam a seu sabor e nos preparam para o que virá:

"... tout peut s'oublier qui s'enfuit deja. Oublier le temps des malentendus et le temps perdu a savoir comment..."
"quando um coração que está cansado de sofrer / encontra um coração também cansado de sofrer / é tempo de se pensar / que o amor pode de repente chegar"
"My baby don´t cares who knows, my baby just cares for me..."

E é assim, ouvindo Jacques Brel, Tom Jobim e Nina Simone, enfim deitados em nosso tapete, que celebraremos o nosso encontro e sorriremos do inverno, que enfim, terá ido embora.

Ainda espero que ele chegue.

quinta-feira, 10 de março de 2011

Ringo e Dori - ou como o sexo estraga tudo.

Essa é a história de Ringo e Dori. Ele um bichón frisé de meia idade e ela uma linda e muito jovem Shi Tzu.
Quando Dori chegou a nossa casa Ringo de imediato assumiu as vezes de macho alfa, passava noites em claro velando seu sono, nos rosnava quando nos aproximávamos dela. Se acordávamos e nos levantávamos durante a noite, ele prontamente se colocava diante dela para que nós não a pisássemos por acidente. Só comia se ela viesse comer com ele e se a pegássemos no colo ficava latindo enlouquecido de ciúmes. Dava até pena vê-lo se arrastando pela casa em virtude das noites em claro protegendo-a e dos dias de agitação acompanhando uma cadelinha tao mais jovem e serelepe.
Isso até pouco tempo, quando Dori entrou em seu primeiro cio.
Por algum descuido nosso, tudo indica que Dori e Ringo, em uma arroubo da natureza e dos instintos, - e pela incontinência de conduta habitual dos machos mamíferos - , cruzaram.
Desde então Dori anda se arrastando pela casa e come mal. Ringo, o antes interessado e protetor macho alfa, mal passa por perto dela. Dorme em outro lugar e já não a protege durante a noite. Come a sua própria comida e se ela não chegar em tempo, a dela também. Hoje presenciei inclusive certa agressividade e falta de paciência dele para com ela.
É verdade, até no mundo animal o sexo estraga tudo.
Bem fez Sam, minha outra cachorrinha, que morreu ano passado. Uma poddle especialíssima, recusou toda e qualquer investida do então jovem Ringo. Assim manteve o interesse dele até o último minuto.
Esse post me inspira uma canção de Vinicius, grande macho alfa mamífero que viveu entre nós. Segue abaixo.

Formosa
(Vinicius de Moraes / Baden Powell)

Formosa, não faz assim
Carinho não é ruim
Mulher que nega
Não sabe não
Tem uma coisa de menos
No seu coração
Formosa, não faz assim
Carinho não é ruim
Mulher que nega
Não sabe não
Tem uma coisa de menos
No seu coração

A gente nasce, a gente cresce
A gente quer amar
Mulher que nega
Nega o que não é para negar
A gente pega, a gente entrega
A gente quer morrer
Ninguém tem nada de bom sem sofrer
Formosa mulher


quarta-feira, 9 de março de 2011

Por um segundo, mais feliz.


Parece que, enfim, se foi o inferno astral. Se foi como o som dos tambores que já quase não se fazem ouvir. Me sinto tranqüila, serena e disposta a seguir em frente. O fim do inferno astral e emocional que estive vivendo desde o inicio deste ano coincidiu com o Carnaval e, claro, aproveitei para celebrar. Celebrei a vida, a alegria de estar viva e de habitar esta cidade.
Precisei conhecer (re - conhecer) um italiano de Bari para que ele me mostrasse a beleza da Liberdade e do sábado de Carnaval. Vivi a saída do Ilê Ayê desde a ladeira do Curuzu e foi impressionante perceber que tudo isso estava na minha cidade e eu mal sabia. Me emocionei com a beleza, elegância e altivez daquelas negras lindas que subiam e desciam a ladeira. Me enterneci com a simplicidade e sabedoria de pai Hamilton e do belíssimo terreiro Vodum Zôo. Deixei acelerar o coração e me entreguei à batida "do mais belo dos belos". Estive confortável dentro de minha própria pele e dentre as pessoas que acabara de conhecer. Vivi o novo e me deliciei com ele.
Agora começa o novo ano e eu finalmente sei o que quero. Quero me sentir bem, quero me sentir feliz, me deixar à vontade. Agora tudo parece tão simples que não entendo a minha confusão.
Eu tenho força para seguir em frente e tenho energia para isso. Só me faltava a delicadeza que sinto agora. A delicadeza da fenix quando renascida.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Revelação

Ando meio deprimida esses dias. Me sinto triste, desmotivada, sem paixão pela vida. Esses sentimentos têm me causado dor física, tenho constantes dores de cabeça e uma espécie de buraco no estômago. Não procurei um psicólogo, porque não acredito em sua ajuda. Ok, sou mesmo cética nesse aspecto, talvez até ignorante, mas não acredito que alguém que não me conhece e nada sabe da minha história possa me ajudar a deixar de sentir tristeza. Estou tentando, como sempre fiz, me curar sozinha. Busco o carinho da minha família e de alguns amigos e converso muito comigo mesma. Talvez por isso, tenho estado tão calada para com os outros.
A verdade é que eu não tenho nenhuma tendência à depressão. Os que me conhecem bem vão dizer que a minha tendência está bem mais para a dramatização das questoes emocionais que propriamente depressão. Sempre me vi, e acredito que os outros também sempre me viram, como uma pessoa solar, alegre de por vida. Mas agora, sinceramente, nao sei dizer o que está acontecendo, e essa sombra em meu olhar me assusta.
Não há um motivo específico. Recentes desilusões amorosas, indefinição profissional, falta de grana, saudade de alguém que está longe. Talvez. Mas um ou outro desses problemas sempre existiram em minha vida, e na vida de qualquer pessoa normal, e isso nunca me abateu tanto.
Tenho chorado muito. Com qualquer coisa. Por qualquer coisa.
Hoje vinha dirigindo e, como sempre, ouvindo música, em mais uma dessas conversas comigo mesma. Começou a tocar o CD de Fagner e Zeca Baleiro, e a música era um mix de A Flor da Pele de Zeca e Revelação de Fagner. Logo me identifiquei porque ando mesmo tão à flor da pele que qualquer beijo de novela me faz chorar. Mas explodi chorando quando Fagner, em sua voz rasgada, cantou pra mim quando a gente tenta/ de toda maneira/ dele se guardar/ sentimento ilhado/ morto e amordaçado/ volta a incomodar. Abriu o sinal e eu fiquei lá parada, com as mãos no rosto.
Talvez eu tenha por tanto tempo superado tudo de maneira tão digna, tão limpa, rindo de mim mesma, amordaçando a tristeza que agora volta a incomodar.
Tenho fé e peço forças para que eu possa superar essa fase.
Talvez seja meu inferno astral, faço aniversário de 33 anos no próximo dia 01 de março. Só espero que passe, logo.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Recesso Sentimental

Estou em recesso sentimental.
Tal qual a corista,
Em jogo de esconde
e mostra
Entre luz
e sombra
Me mostro
sem querer mostrar nada.
Ainda.